Ontem à noite (27/5) a MTV Brasil estreou sua nova série original. Estranhamente, A Menina Sem Qualidades foi anunciada pela MTV como a primeira investida do canal na área de dramaturgia. Parece que o próprio canal esqueceu que já tinha oferecido em 2009 a boa Descolados, produzida pela Mixer. A Menina Sem Qualidades também não é uma série e sim uma minissérie produzida pela Estúdios Quanta em parceria com a Quanta Post.
Ao contrário de Descolados, que era um texto original de Luca Paiva Mello, A Menina Sem Qualidades é uma adaptação do romance alemão Spieltrieb, de Juli Zeh. A obra já ganhou uma versão cinematográfica na Alemanha, onde estreará em outubro deste ano, e uma versão para o teatro.
Com roteiro de Felipe Hirsch, Renata Melo e Marcelo Backes, que traduziu o livro para o português (lançado pela editora Record), a série ofereceu um bom primeiro episódio. Trabalhando o tema ‘a falta de moral e suas consequências’, a história acompanha a vida de dois jovens que decidem manipular as regras de comportamento social.
O primeiro episódio cumpre bem o papel de introduzir um dos protagonistas da história, oferecendo ao público uma espécie de justificativa de suas ações futuras.
Ana (Bianca Comparato) é apresentada como uma jovem de dezesseis anos muito inteligente. Tendo lido todos os livros deixados pelo pai, ela também ‘devorou’ as obras disponíveis na biblioteca de sua escola. Se é inteligente ainda não sabemos, mas referência cultural ela tem, o que a torna uma jovem solitária.
Ana não é adepta de modismos ou das novas tecnologias mas anseia por encontrar alguém com quem possa dividir seus interesses.
Para complicar, a menina ainda está descobrindo sua sexualidade. Ela se envolve com Selma (Gabriela Poester), uma colega de escola, com quem costuma compartilhar suas descobertas literárias. Quando os pais de Selma descobrem sobre o relacionamento das duas, eles a afastam de Ana, que se torna uma excluída em seu meio. Agredida fisicamente por seus colegas de escola, Ana assume uma postura de conformidade.
A relação de Ana e Selma, e suas consequências, são mostradas ao público em cenas de flasbacks. Quando a história tem início, Ana já está estudando em uma nova escola onde, depois de repreender um de seus professores, chama a atenção de Olavo (Rodrigo Pavon), um colega que aparece mais tarde fazendo companhia a ela depois que Ana é agredida por alunos.
Sua relação com a mãe é distante. Luna (Luna Martinelli) é uma mulher de trinta e poucos anos que teve Ana ainda muito jovem. Depois que seu marido morreu, ela se casou com o General (Ivo Müller), de quem está se divorciando. A mãe não parece compartilhar do mesmo interesse da filha pelos livros ou pelos debates ideológicos, embora esteja a par do tipo de literatura que desperta o interesse da menina. Sem saber direito como educá-la, ela dá liberdade a Ana de se fechar em seu mundo. Vivendo na mesma casa, as duas são mulheres solitárias e excluídas, cada uma em seu universo.
Com apenas meia-hora de duração, o episódio também introduziu Tristán (Javier Drolas), professor de literatura e espanhol. Ele é um argentino que foi preso político durante a ditadura militar de seu país. Tristán é casado com Bianca (Inês Efron), uma mulher depressiva que ainda não conseguiu aceitar a perda do pai, morto pelos militares argentinos.
A história vai se desdobrar em doze episódios, que serão exibidos de segunda a quinta pela MTV. Ao longo da trama, Ana se envolverá com Alex (Rodrigo Pandolfo), um jovem de dezoito anos que tem como passatempo questionar os valores das regras sociais. Ele transformará Ana em uma discípula, manipulando seus desejos e vontades, tornando-a dependente dele.
A Menina Sem Qualidades traz um bom elenco e roteiro, o qual consegue introduzir a situação dos personagens sem se tornar excessivamente didático. Outro ponto positivo da série é a fotografia. Não é raro ver as séries brasileiras extrapolarem no visual (por vezes para esconder um texto fraco). Assim, o público pensa estar vendo uma boa série só porque a fotografia e o trabalho de câmera são muito bons.
Aqui a imagem acompanha a proposta da história e do tom pessoal do texto. Ainda fazendo um trabalho de luz e câmera, a imagem não se sobrepõe nem engole os personagens, dando-lhes liberdade de existir. Por vezes fixas e em outros momentos em movimento (sem ser frenético), a câmera consegue coexistir com os atores.
A julgar pelo primeiro episódio, A Menina Sem Qualidades parece ser uma história que será movida pela psicologia dos personagens e não uma trama na qual eles são manipulados pelos roteiristas para reagirem às situações criadas por eles. Vamos ver se vale a pena.
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