quarta-feira, 5 de junho de 2013

Contos do Edgar – 01×03 – Íris

Por Marja Martins    


canalfox bra contos galeria ep3 0003 Contos do Edgar   01x03   Íris
“Mais que os outros estava aguçado o sentido da audição. Ouvi todas as coisas no céu e na terra. Ouvi muitas coisas no inferno. Como então posso estar louco? Preste atenção! E observe com que sanidade, com que calma, posso lhe contar toda a história”.
Achei legal essa história de começar as reviews de Contos do Edgar com trechos dos contos que estão inspirando os episódios da série. Decidi tornar isso minha marca registrada icon biggrin Contos do Edgar   01x03   Íris . Como já falei para vocês,  apesar de estar acompanhando a trama com bastante entusiasmo, ainda não tinha sentido o clima de suspense  e a profundidade que uma série focada na obra de Edgar Allan Poe deveria transmitir, isso até eu assistir Íris semana passada.
A série agora começa a caminhar para um crescente nesse sentido. Se em Priscila e Berenice, nossas protagonistas apenas sofriam com as ações desencadeadas pelas loucuras e devaneios de seus amantes e parentes, Íris se mostrou uma protagonista bastante ativa. Uma menina que vive no submundo das drogas, das baladas, de tudo que é obscuro, permissivo, underground, em outras palavras, tudo aquilo que lembra Poe.  Acho que até agora, de todas as trágicas moçoilas que passaram por nossas telinhas, Íris é a que mais resgatou o espirito de inquietude, obscuridade e os questionamentos que a obra de Poe coloca em foco em cada conto.
Abro nossa discussão sobre este episódio com a mesma pergunta feita pelo que nosso mórbido herói: “Será que música alta e gente feliz no meio da noite, podem incomodar os monstros que vivem dentro da gente?”. Quando li que Íris se basearia em dois contos de Poe, ao invés de apenas um, fiquei curiosa para saber como eles encaixariam as duas histórias. Apesar de ter lido “O Coração Delator” e “O Demônio da Perversidade”, jamais percebi semelhanças entre os dois.
Em “O Coração Delator”, um homem atormentado pelos olhos azuis de um velho acaba cometendo homicídio para tentar dar fim em sua própria agonia, já em “O “Demônio da Perversidade”, temos um relato de um jovem  que almejava  a fortuna de uma velha parenta e decide mataála com uma vela envenenada. Ambos os contos trazem por meio de suas narrativas de homicídio, verdadeiros ensaios sobre o inconsciente humano. No primeiro, Poe relata um caso de monomania, um tipo de paranoia em que a pessoa que a possui se torna obcecada por uma ideia ou pessoa e no segundo um verdadeiro ensaio sobre a psicopatia.
canalfox bra contos galeria ep3 0001 Contos do Edgar   01x03   Íris

Ao trazer estes dois textos para a TV. Contos do Edgar chega ao seu melhor episódio até agora. Voltando a pergunta de nosso Edgar tupiniquim, o que acontece durante a noite pode sim despertar nossos sentimentos, medos e desejos mais obscuros. Quem nunca teve medo do escuro quando era criança? Quem nunca perturbou o papai ou a mamãe porque confundiu um armário ou cabide com um monstro e não conseguiu mais ficar sozinho no quarto? Quem nunca apressou o passo na rua porque o local que estava caminhando lhe parece soturno, suspeito ou perigoso? Assim, quando Edgar nos apresenta o caso de Seu Jorge e a menina Íris, temos uma situação mais ou menos parecida. Só que ao invés de monstros e escuridão, nós temos algo pior.
Ao realizar festas regadas a muito álcool, drogas e musica alta, a menina Íris acaba incomodando o nosso vovô não só com o barulho, mas também com a juventude e o vigor físico que seu Jorge já não possuía mais. O barulho de festa passa a se tornar um lembrete audível de que Jorge estava no final da vida, era um velho decrepito que já não possuía utilidade nenhuma. O Som começa a martelar sua cabeça, deixa de ser um lembrete e passa a se tornar uma ideia fixa. Será que realmente a idade lhe tirara a vitalidade e a vontade de ser feliz? O som passa a se tornar mais que uma situação  incomoda entre vizinhos, ele se torna uma monomania, uma ideia fixa que leva nosso simplório velhinho a cometer um ato extremo.
Ao contrário de nossas outras heroínas, Íris, não é nem de longe uma vitima dos delírios das pessoas ao seu redor. Ela é a personificação do demônio da perversidade, da ideia fixa e dos impulsos autodestrutivos que habitam cada um de nós. Afinal, todo mundo tem um lado bom e um ruim. Todos nós “teremos a violência do conflito que se trava dentro de nós, entre o definido e o indefinido, entre a substância e a sombra. Mas, se a contenda se prolonga a esse ponto, é a sombra que prevalece” (trecho do conto O Demônio da Perversidade). Íris representa essa escuridão, esse desejo pelo proibido, pelo obscuro, o impulso de transgredir as regras de convivência social e desrespeito pelo próximo em detrimento de nossos próprios prazeres. Íris é não só a vitima do homicídio tramado por Jorge, ela também foi causadora de toda a situação em que se envolveu.
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O fim do episódio é exatamente como o fim dos dois contos, nosso assassino desesperado confessa seu crime, não por que sente culpa, mas porque a sua mente já se encontra dominada pela angústia e pela loucura, a doença que exacerbara seus sentidos e os destruiu. Para mim este  foi um episódio bem melhor que os outros no sentido de se aprofundar no conteúdo encontrado na obra de Poe.
Vou encerrando por aqui, aguardando ansiosamente a próxima terça-feira onde teremos uma adaptação de um dos meus contos favoritos “A Máscara da Morte Rubra”. Vamos ver o que o nosso Edgar Tupiniquim encontrará a se cruzar o caminho de Cecília, nossa próxima heroína.

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