quinta-feira, 31 de março de 2011

Em livro, Lauro César Muniz conta porque deixou a Globo

Principal nome do time de autores de novelas da Record, Lauro César Muniz lança hoje sua biografia, "Lauro César Muniz Solta o Verbo".

O evento será na Cinemateca Brasileira, em São Paulo, a partir das 19h. Muniz estará no local autografando a obra.

O livro integra a coleção "Aplauso", da Imprensa Oficial, dedicada à preservação da memória do cinema, teatro e televisão brasileiros. A partir de amanhã, estará disponível para download gratuito no site da Imprensa Oficial (clique aqui).

O livro foi escrito em 2005, mas só agora chega às livrarias. "É uma biografia da minha vida profissional com alguns toques de questões mais pessoais", define Muniz, autor de Cidadão Brasileiro (2006) e Poder Paralelo (2009), na Record, além de Escalada (1975), O Casarão (1976), Os Gigantes (1979), Roda de Fogo (1986) e O Salvador da Pátria (1989), entre outras novelas e minisséries que escreveu para a Globo.

No livro, Muniz conta em detalhes episódios como a crise que teve com o diretor Jaime Monjardim, durante a produção da mininissérie Aquarela do Brasil, em 2000, e sobre sua saída da Globo, em 2005, após cinco anos na "geladeira" (sem conseguir produzir nenhuma de suas ideias). Muniz então retornou à Record, onde trabalhara entre 1970 e 1972.

A seguir, trecho do livro de Lauro César Muniz em que ele narra sua saída da Globo (lembre-se que a obra foi escrita em 2005):

'O monopólio é sempre nocivo e perigoso. Uma das razões que me anima a trabalhar na TV Record foi contribuir para abrir o mercado de trabalho, gerando uma concorrência.'

(Lauro César Muniz)

"Nos últimos anos houve uma grande transformação no quadro administrativo da Rede Globo, com mudanças não apenas nos nomes, mas de filosofia de trabalho, de opções por novelas mais populares, mais esquemáticas, de fácil comunicação. Nesses últimos anos apresentei cinco projetos excelentes, de telenovelas e minisséries. Alguns chegaram a entrar em produção; depois, por razões nem sempre muito claras, foram abandonados.

Alguns trabalhos que apresentei à Globo e que ficaram nas gavetas: Mãe Terra, em parceria com Rosane Lima, baseada no maravilhoso romance "A Mãe da Mãe de Sua Mãe e Suas Filhas", de Maria José Silveira; Tutti Frutti, novela em parceria com Renato Modesto, baseada em três obras de Molière; Vendetta, baseada no romance de Sílvio Lancellotti; e Espumas Flutuantes, a vida de Castro Alves.

A gota d'água de meu desânimo aconteceu em 2004 numa reunião em que o Mário Lúcio Vaz, diretor artístico, mencionou que meu projeto sobre Castro Alves poderia ser produzido em 2009. Havia ironia e deboche em sua frase. Eu já estava congelado há quatro anos!

Decidi, a partir dessa reunião, que buscaria outro caminho fora da TV Globo. Tinha convites de uma emissora de Santiago do Chile para assumir a supervisão de um departamento de novelas e fazer trabalhos de minha autoria. E percebia também o movimento da TV Record, que abandonara a terceirização desastrosa para produzir suas própria telenovelas. Almocei com o Hiran Silveira, diretor responsável pelas novelas da Record, e senti que estava diante de um projeto bem planejado e sério. Comecei então a analisar as possibilidades de sair da Globo e voltar a escrever para a televisão.

Já estava decidido a ir para a Record, no início de janeiro 2005, quando a TV Globo me propôs fazer uma telenovela, retomar um tema que eu já havia apresentado. Imperatriz do Café foi inicialmente cogitado para ser uma minissérie, depois eu mesmo sugeri que virasse novela. A história, baseada no livro O Lírio e a Quimera, do Romaric Büel, é um folhetim maravilhoso, uma mistura inteligente do universo de Vítor Hugo e Alexandre Dumas. Nesse momento, informei à TV Globo que não renovaria contrato. O Carlos Manga [diretor da emissora] ainda insistiu, afirmando que agora era pra valer, mas... mas eu já tinha em mãos uma proposta irrecusável da TV Record, não pelo valor da proposta, mas por me abrir as portas com um novo horário, com perspectivas muito animadoras.

Trabalhei muito durante os 33 anos em que permaneci na Rede Globo. Sou um dos autores que mais produziu teledramaturgia: escrevi e participei de 19 novelas e minisséries, vários teleteatros, cenas cômicas para o Fantástico, substitui dois colegas que não tinham condições de terminar seus trabalhos, supervisionei vários outros. Não creio que a Marluce (Dias da Silva) e o Octávio Florisbal, que hoje comandam a emissora [nota do blogueiro: Marluce não dirige mais a TV Globo], ou mesmo os Marinho, tivessem consciência plena do processo de congelamento de meu nome. Senti na Marluce um espanto quando comuniquei minha saída. Tivemos um longo e emocionado papo pelo telefone. Com o Florisbal, tive um contato pessoal excelente, harmonioso e ele entendeu as razões da minha decisão.

O monopólio é sempre nocivo e perigoso. Uma das razões que me anima a trabalhar na TV Record foi contribuir para abrir o mercado de trabalho, gerando uma concorrência. É claro que a Record de hoje nada tem a ver com a Record que eu deixei [em 1972]. É outra administração, que vem construindo uma rede com empenho e planejamento.

Fui o último autor a deixar a TV Record para ir para a TV Globo e o primeiro a voltar."

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