domingo, 3 de março de 2013

Laura no sanatório: História é inspirada em casos reais

Laura é internada pela própria mãe para evitar escândalo (Foto: Lado a Lado / TV Globo) 
Laura é internada pela própria mãe para evitar escândalo
(Foto: Lado a Lado / TV Globo)

Acuada, Constância (Patrícia Pillar) é capaz de tudo para impedir que Laura (Marjorie Estiano) denuncie um esquema de corrupção no Judiciário do qual a megera faz parte - Constância "comprou" o promotor do processo movido por Isabel. Para isso, ela chega ao limite da razão e interna a própria filha em um sanotório. A autora Cláudia Lage conta que esse momento dramático foi inspirado em histórias reais e serve para mostrar o quanto muitas mulheres sofreram, apenas por sonharem com novos horizontes. Confira a entrevista:

Na época, era comum mulheres serem internadas em sanatórios simplesmente por contrariarem seus pais ou maridos? Isso aconteceu com mulheres que se destacaram pelo trabalho intelectual, no jornalismo, por exemplo?
Cláudia Lage - "Era uma prática comum no século XIX, que perdurou até meados do século XX. Na pesquisa que nossa pesquisadora, Luciane Reis, fez pra gente, os prontuários dos médicos eram impressionantes. As justificativas para a internação parecem inverossímeis aos olhos de hoje. 'A paciente apresenta grave obsessão por livros', 'desprezo pela família', 'excitação sexual nervosa', 'recusa em ter filhos'. Um dado notável é que boa parte das pacientes nos sanatórios eram mulheres que haviam estudado além do estipulado para as mocinhas na época, que só aprendiam o suficiente para ler, escrever e fazer contas. Elas foram além, fizeram o curso normal ou ainda eram normalistas, dedicavam-se ou não ao magistério, mas eram mulheres com o intelectual acentuado, com interesses sociais e profissionais, que fugiam à ideia do casamento e da maternidade como o único destino possível. Não que não quisessem se casar e ter filhos, mas buscavam também a realização pessoal fora da família. Foram tantas mulheres que passaram por isso, a maioria anônimas, que os seus nomes só chegaram a nós por meio de suas tristes histórias, já que todo o impulso delas de independência foi sufocado pelos familiares, o pai ou o irmão, ou pelo marido, que tinham a autorização para interná-las mesmo contra a vontade. Quer dizer, eles tinham o poder de julgar e decidir se suas esposas, irmãs e filhas eram loucas ou não, e interná-las caso assim desejassem. Do mesmo modo, só eles, ou uma junta médica, podia tirá-las do sanatório, ou deixá-las para sempre lá, como foi o caso de muitas".

No sanatório, Laura vai contar com a ajuda de uma interna. Essa personagem representa alguma dessas mulheres que queriam mais da vida?
Cláudia Lage - "Laura vai conhecer no sanatório uma interna, a Judite, que, como ela, não tem nenhum problema psiquiátrico e também foi jornalista quando mais jovem. Inspirada em muitos casos reais, que vimos na pesquisa, Judite foi internada pelo próprio marido e esquecida no sanatório. Quando Laura chega, ela já está lá há 11 anos. A personagem ganhou esse nome, Judite, em homenagem a um texto da escritora Virgínia Woolf, no qual fala que se Shakespeare tivesse tido uma irmã tão talentosa quanto ele, ela nunca teria as mesmas oportunidades, e nunca se tornaria uma grande dramaturga. Virgínia batiza essa irmã fictícia de Judite. Enquanto Shakespeare ia para a universidade, Judite ficava em casa descascando batatas, por imposição dos pais. Essa irmã de Shakespeare, criada pela Virgínia Woolf, simboliza todas essas mulheres repletas de potenciais e de desejos, todos refreados e sufocados pela mentalidade sexista da sua época".

Constância vai ter alguma crise de consciência depois dessa maldade? Ela vai perceber que passou dos limites?

Cláudia Lage - "Constância vive de acordo com os próprios princípios. Ela justifica os atos mais cruéis como um sacrifício pelo bem e pela reputação da família, e fará o mesmo com a internação da Laura. Para ela, a filha passou dos limites ao querer ser uma jornalista profissional, somando a isso a matéria que Laura vai escrever sobre a corrupção no judiciário e a decisão de depor como testemunha da Isabel. No sanatório, a mãe leoa, que, apesar da vilania, ama a filha, dará lugar à mãe cruel e devoradora, que não aceita que o filho reja o próprio destino".

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