Quem acompanha novelas tem algumas curiosidades a respeito da mecânica de como elas são feitas. Sempre surgem algumas perguntas. Por exemplo, por que os autores precisam de co-autores e colaboradores? O que é uma escaleta? Como os autores bolam suas tramas? Eles sempre escolhem o elenco das tramas que escrevem?
Pensando nisto, o Projeto Memória da Rede Globo produziu "Autores - História da Teledramaturgia" (Ed. Globo). São dois livros contendo perfis, depoimentos e a lista de trabalhos de 16 autores de teledramaturgia da Globo, organizados por ordem alfabética: Aguinaldo Silva, Alcides Nogueira, Antonio Calmon, Benedito Ruy Barbosa, Carlos Lombardi, Euclydes Marinho, Gilberto Braga e Gloria Perez; e João Emanuel Carneiro, Manoel Carlos, Maria Adelaide Amaral, Miguel Falabella, Ricardo Linhares, Silvio de Abreu, Walcyr Carrasco e Walther Negrão.
Enquanto, "Autores - História da Teledramaturgia" é composto de 482 páginas cada, os livros são resultado de cerca de 70 horas de entrevistas e reúnem perfis e dos autores, garantindo uma rica fonte de conhecimento e diversão para quem aprecia boas histórias. Os escritores da falam sobre suas trajetórias profissionais, métodos de trabalho, universos de criação, a relação com o público e o futuro da telenovela, além de contarem como constroem suas tramas, de que forma lidam com a audiência e que mudanças as novelas sofreram ao longo dos anos. A publicação também aborda passagens curiosas de muitas obras que marcaram a cena televisiva nos últimos 50 anos, desde os tempos dos teleteatros e adaptações de radionovelas, até os mais recentes trabalhos de ficção produzidos na TV Globo. Leia alguns trechos, mas não deixem de comprar os livros, pois são um documento histórico e também rica fonte para pesquisadores.
Aguinaldo Silva - “O bom vilão é canastrão, faz o telespectador rir. É um pouco como o Tom do desenho animado Tom & Jerry. Ele esmaga aquele ratinho mil vezes por dia, prepara as armadilhas mais ardilosas, mas sempre leva a pior, e todo mundo morre de rir. Os meus vilões são assim. Se você fizer o vilão sério, mau, rancoroso, terrível, as pessoas rejeitam, não gostam. Quanto ao bom herói, ele deve ser absolutamente imaculado.”
Benedito Ruy Barbosa – “O meu universo é o Brasil. Normalmente, um ator vai a Paris ou Nova York quando termina de gravar uma novela. Eu vou para o Pantanal, para o sul de Minas ou para o Araguaia. Estou sempre mexendo com esse sertão, porque tenho uma ligação muito grande com a terra. É uma força telúrica mesmo.”
Gilberto Braga – “Vale tudo surgiu de uma discussão familiar. Eu estava jantando com os meus parentes mais próximos, e alguém chamou meu padrinho de medíocre e babaca. O meu padrinho, irmão da minha mãe, era delegado de polícia, como meu pai, e sempre foi conhecido como um policial não-corrupto.”
Manoel Carlos – “Situo todas as minhas novelas no Rio de Janeiro. Faço coisas muito fortes sob um céu muito azul. As tragédias e os dramas estão acontecendo, mas o dia está muito lindo, sempre. A praia e o espírito carioca acabam dando uma amenizada, uma coloração rosa ao contexto cinzento... Nada no Rio fica muito grave, nem as coisas gravíssimas.”
Ricardo Linhares – “O vilão é mais fascinante, sempre foi. Quem é mais fascinante: a Branca de Neve ou a rainha má? É a rainha má, mas a Branca de Neve é fundamental para torcermos por um final feliz. Em novela, acontece o mesmo. Neste momento, acho que nosso grande desafio é humanizar os heróis.”
Silvio de Abreu – “(Sobre a censura sofrida por Vereda Tropical) Quando estávamos saindo da sala, uma das censoras me falou: ‘Sabe o que é, seu Silvio? O senhor fez uma novela tão bonita antes, Guerra dos sexos. Gente fina, com roupa de pele, gente tão bonita. Agora o senhor faz essa novela de gente pobre? Gente pobre é muito feio, deseduca o povo. Eu sou que nem o Justo Veríssimo, o personagem do Chico Anysio, eu quero que pobre exploda’. Isso aconteceu, de verdade... Na época da Censura, os protagonistas teriam que ser pessoas de grande valor moral. Eles sempre achavam que o povo iria se espelhar nos personagens e querer ser como eles, mas isso é uma visão muito pobre e simplista de uma sociedade. Não acredito que escondendo os nossos problemas vamos achar solução para eles.”
Walther Negrão – “Comecei como figurante. Cláudio Marzo, Fúlvio Stefanini, Rolando Boldrin e eu éramos os quatro figurantes “principais”. O Cláudio era lindo, moreno; o Fúlvio também, só que louro; Rolando, um belo tipo, tocava violão; e eu era o patinho feio, e muito mau ator.”
Aliás eu preciso deixar claro que este Projeto merece todos os méritos pelo seu trabalho pioneiro de preservação da memória da televisão e da Rede Globo. Ela já lançou o “Dicionário da TV Globo”; “Jornal Nacional”; “Almanaque da TV Globo”; e agora, chega às livrarias a sua mais recente criação.
As pioneiras Tupi, TV Rio, Record, Continental e Excelsior não tiveram tempo de pensar na memória, pois estavam preocupadas - com justa razão - em descobrir como funcionava uma emissora de televisão.
Alguns estudiosos, atualmente, estão tentando preencher está lacuna, como Álvaro Moya, que escreveu sobre a TV Excelsior, a atriz Vida Alves, falou sobre a Tupi e, Elmo Francford, fez um belo trabalho sobre a Rede Manchete.
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