sexta-feira, 4 de março de 2011

Discussão sobre homofobia faz entrada triunfal em “Insensato Coração”


Coincidência ou uma ação combinada, não sei dizer, o fato é que, no intervalo de 15 dias, duas novelas da Globo trataram de um mesmo tema polêmico – a intolerância e o preconceito contra homossexuais. Primeiro, foi “Ti-Ti-Ti”, como observei aqui, ao mostrar um homem fazer uma declaração de amor para outro.

Agora é a vez de “Insensato Coração” revelar o pensamento e as reações de um personagem explicitamente homofóbico. Com a falta de tato que tem caracterizado a novela, o assunto foi tratado de forma abrupta, despejado mesmo, numa sequência de três cenas na noite de quarta-feira.

Kleber (Cássio Gabus Mendes, foto) é repórter de economia de um jornal. Foi apresentado há alguns capítulos, dando um “furo de reportagem” sobre falcatruas cometidas por Horácio (Hérson Capri), um poderoso banqueiro. Esta semana, a novela o mostrou novamente em ação, com mais um “furo” sobre o mesmo assunto.

No capítulo de quarta, ao final da jornada de trabalho, Kleber entra na sala do editor, Álvaro (Ricardo Rathsam), para se despedir. A conversa logo é interrompida pelo telefone. Ouvimos o editor dizer: “Fala, gatinho. Não, tô aqui ainda. Levo uma hora aqui ainda. Não precisa me esperar pra jantar. Beijo, meu lindo.”

Na sequência, Álvaro e Kleber conversam sobre a reportagem que será publicada no dia seguinte no jornal, mas que teve uma parte antecipada na internet. O repórter lamenta que isso tenha ocorrido, ouvindo do editor: “Você vai ter que rever essas suas posições jurássicas sobre jornalismo online”. O repórter, então, responde: “Você tem razão. Eu sou meio avesso a essas modernidades. Alguns conceitos, como bom jornalismo, casamento, já estavam aperfeiçoados. Não precisam de novidades”.

Na sua segunda cena, Kleber discute com a ex-mulher, Daisy (Isabela Garcia), por causa da pensão familiar atrasada. E diz: “Nem me fale do meu trabalho. Agora entrou um editor lá, que eu vou te contar. Uma bichinha, fica no telefone marcando encontro com o namorado na minha frente. E eu tenho que obedecer esse sujeito”. Daisy protesta: “Não acredito que estou ouvindo isso”. E Kleber prossegue: “Não dá uma de moderninha. É uma inversão de valores, sim. A imprensa brasileira não pode cair na mão deste tipo de gente”.


Na cena seguinte, Kleber chega ao bar do irmão, Gabino (Guilherme Piva), onde Natalie (Deborah Secco) está conversando com seus dois amigos gays, Roni (Leonardo Miggiorin, foto) e Nelson (Edson Fieschi). O jornalista diz: “Ô Gabino, isso aqui virou bar de boiolas? Vai espantar a freguesia toda”. Gabino responde: “Quem está espantando a freguesia é você.” Nelson interfere na conversa e pergunta: “Algum problema aí, Gabino?” Kleber diz: “Tem problema, sim. Vão no bar apropriado para vocês. Isso aqui é um ambiente familiar”.

Nelson diz que é advogado e ameaça processá-lo. Roni se levanta e, sem a afetação que exibe em todas as suas cenas, faz um longo discurso: “Ele tem todo o direito de proteger a família dele de pessoas como nós. O senhor tem filhos? Pois vai ensinando eles a não respeitarem as diferenças e os direitos dos outros, a serem agressivos e intolerantes. Quem cresce assim acaba se metendo em confusão, mais cedo ou mais tarde. Questão de tempo para parar na cadeia. Esse é o exemplo que o senhor quer para eles? A única ameaça ao ambiente familiar aqui é o senhor, com este triste espetáculo de incivilidade, falta de educação e violência”.

Gilberto Braga e Ricardo Linhares não podem mais ser acusados de tratar da problemática do universo gay em suas novelas de forma superficial, ignorando os problemas dos homossexuais. Resta saber se vão desenvolver este tema ou, como outros, ele apenas fez uma aparição-relâmpago em “Insensato Coração”.

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